No futuro, inteligência artificial poderá funcionar como “assistente” de profissões criativas como designers, escritores e até programadores

Wayra Brasil
6 min readNov 7, 2022

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Falar de inteligência artificial hoje em dia é algo que ultrapassa a indústria da tecnologia. Conhecida pelas iniciais IA, ela atravessa setores tão diversos como a computação, a biotecnologia, os cuidados de saúde, análises de negócios e até questões de segurança pública.

Não à toa, muitas das startups de destaque da atualidade estão diretamente envolvidas com a inteligência artificial em um modo ou outro, seja para melhorar a eficiência de cadeias logísticas ou da produção no campo, para recomendar produtos ou os melhores candidatos para uma vaga (como faz a Gupy), detectar fraudes e garantir segurança ao detectar padrões de movimento em câmeras monitoradas (como faz a Gabriel), gerar análises de crédito (expertise da Dataholics) ou fazer predição e geração de insights a partir de dados (especialidade da Spume).

A mais recente novidade é que a IA poderá também estar envolvida na oferta de uma certa “assistência” a designers, escritores e até programadores, por meio de algoritmos especialmente criados para essa função, como é o caso do DALL-E, do GPT-3 e do GitHub CoPilot.

Imagem e texto criados por máquinas

As mais recentes evoluções da IA já são tema de relatórios de tendências e discussão de experts em analisar cenários de futuro já há algum tempo. Em 2022, o assunto ganhou contornos mais intensos por conta da maior facilidade do seu uso, como foi demonstrado pela capa da revista Cosmopolitan dos EUA, que foi ilustrada a partir de uma requisição (conhecida como “prompt”) para o algoritmo DALL-E (pronuncia-se Dalí, como em Salvador Dalí), da OpenAI.

O DALL-E é um algoritmo (ou modelo) treinado a partir de uma base de dados da OpenAI para que fosse capaz de manipular conceitos visuais por meio de frases. Dessa forma, é possível fazer uma “requisição” em texto para o DALL-E, que irá devolver dentro de alguns poucos segundos uma variedade de imagens que correspondem a propostas artísticas sobre a sua proposta textual.

Pedidos como “uma poltrona na forma de um abacate”, por exemplo, podem retornar ideias como essas da imagem abaixo, destacada por Amy Webb no seu mais recente relatório de tendências:

Por enquanto, o uso do OpenAI ainda não é aberto a todas as pessoas, mas é possível ter uma noção da experiência ao experimentar serviços similares, como o Craiyon, modelo de inteligência artificial que desenha imagens a partir de requisições em texto, de modo semelhante ao DALL-E.

Da mesma forma que a IA é capaz de “criar” arte visual, a proposta também é válida para a arte textual. A mesma OpenAI que desenvolve o DALL-E também é responsável pelo modelo algorítmico GPT-3, que é capaz de gerar textos que se parecem muito com a nossa linguagem natural escrita. Hoje, esse sistema é capaz de produzir textos em língua inglesa que são praticamente indistinguíveis de um texto escrito por um ser humano.

Tanto é que Webb fez questão de incluir em seu relatório um trecho totalmente escrito por essa inteligência artificial, a partir de um comando de texto simples: “Por favor, escreva um curto artigo de opinião de cerca de 500 palavras. Foque em como a IA vai evoluir no futuro. Faça com que pareça ficção científica, mas mantenha o texto factual”. Depois de algumas tentativas, a versão favorita da futurista, que levou menos de 5 segundos para ser gerada, foi levemente editada para constar no relatório.

E se você achou que apenas escritores e artistas seriam afetados, achou errado. Até mesmo programadores poderão contar com o auxílio de IAs, como a que está sendo testada pelo GitHub CoPilot, ferramenta que funciona como uma espécie de “autocompletar para linhas de código”. Ao ser treinada com centenas de milhares de linhas de código, o CoPilot funciona literalmente como um copiloto da pessoa que está programando, auxiliando desenvolvedores a completar desde linhas de código mais simples até a criação de blocos de códigos, como funções ou classes.

A ideia é que da mesma forma que escritores e artistas poderão se dedicar mais a editar e refinar suas artes inicialmente geradas por algoritmos, programadores também se tornarão espécies de editores de linhas de código, dedicados a polir o código desenvolvido pelas máquinas.

IA fará cada vez mais parte do futuro

Tanto o DALL-E como o GPT-3 têm sido apontados como modelos para serem observados e acompanhados de perto, para que o seu desenvolvimento e avanço aconteça de maneira ética. Isso porque existem uma série de problemas associados ao seu uso massificado. O primeiro deles tem a ver com o desemprego, já que as máquinas poderão fazer de modo muito mais rápido o que artistas, escritores e programadores fazem.

Além disso, o viés desses modelos algorítmicos ainda é um problema. A base de dados que os treina precisa ser diversa o suficiente para que os textos consigam evitar cair em problemas de discriminação ou discurso de ódio, por exemplo. Há uma grande preocupação de pesquisadores e estudiosos para que essas bases possam ser sofisticadas, diversas, amplas, criativas. No entanto, ainda não se sabe que profissionais estarão envolvidos no trabalho de criar bases para que IAs façam mashups no futuro.

Outro ponto bastante polêmico tem a ver com a questão dos direitos autorais, o que afeta especialmente modelos como o do Github CoPilot, que utiliza trechos de códigos públicos, muitos publicados sob licenças abertas, mas que não prevêem nem garantem esse tipo de uso. Entre os críticos mais ferrenhos, existe a percepção de que essas IAs não estão criando coisas novas, mas apenas remixando coisas que já existem para resolver demandas básicas do cotidiano. Criações novas, que resolvam problemas também novos ou que sejam soluções inéditas, ainda precisariam de seres humanos envolvidos no processo. No entanto, apesar dessa limitação real, fato é que para a maioria esmagadora dos casos, as soluções ofertadas pelas IAs são suficientes para as necessidades mais frequentes, o que se torna um curioso impasse.

Por enquanto, a expectativa é que ferramentas como o DALL-E, GPT-3 e GitHub CoPilot funcionem como espécies de assistentes de brainstorm, seja para a criação de artes, de textos ou linhas de código. Isso porque ainda é preciso que exista um ser humano fazendo a requisição (o prompt) e fazendo ajustes de edição (na imagem, no texto ou no código).

Dessa forma, é quase como se profissões criativas estivessem ganhando uma nova ferramenta para trabalhar, o que pode abrir a possibilidade de maior inclusão de profissionais. Em seu trabalho para a Cosmopolitan, a artista Karen X. Cheng destacou que o DALL-E permitiu que ela fosse responsável pelo design de uma capa de revista mesmo sem ter a habilidade de desenhar, por exemplo. Essa inclusão não significa que as pessoas envolvidas não precisem ter expertise ou especialidades artísticas: o prompt feito por Cheng era bastante refinado, sabendo exatamente com que terminologias fazer a requisição para o modelo algorítmico.

Independente do que venha a acontecer, é importante ter em mente que há um cenário de futuro em que ao invés de um assistente de arte, um redator ou um desenvolvedor júnior, os profissionais contem com a assistência de inteligências artificiais, que serão responsáveis por criar o equivalente de mockups, rascunhos ou primeiras versões de artes, textos e linhas de código.

Será que estamos prontos para tutorar e ser assistidos por máquinas? Talvez esse futuro esteja mais próximo do que imaginamos.

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